25 - A PRIMEIRA PARADA


 
25 - A PRIMEIRA PARADA

 

- Ainda bem que esse toco não sai do lugar, né?

- Maria, não enche...

- Sério... se a gente dependesse da sua habilidade no laço prá se livrar de uma encrenca, a gente tava perdida...

- Como se você soubesse fazer melhor...

- Eu não sei... é por isso que a gente tava perdida...

Maria e Graça estavam acampadas a algumas léguas do arraial onde moravam. Resolveram fazer uma pausa em sua caminhada, para treinar um pouco com o laço e o revolver. Afinal, não sabiam usar nem uma coisa nem outra...

- Graça, posso te perguntar uma coisa?

- Pergunta...

- Porque é que você resolveu se vestir toda de preto?

- Jura que, se eu falar, não vai mangar de mim?

- Juro...

- É que ouvi falar que o Juvêncio está por essas bandas...

- Quem? Aquele mascarado?

- É... não ia ser demais se a gente cruzasse com ele por esse mundão?

- Não sei... mas o que ele está fazendo por aqui?

- Cassando algum bando de malfeitores, com certeza...

- Desde que não seja o Ferreira...

- Acho que não... o Zé Ferreira é peixe pequeno... ele costuma ir atrás dos tubarões...

Depois de errar pela centésima vez sua laçada, Graça faz uma pausa, para tomar o café que a amiga havia acabado de preparar. As duas ficaram por alguns instantes em silêncio. Novamente, Maria foi a primeira a puxar assunto...

- E a sua mãe?

- O que tem ela?

- Sabe o que você resolveu fazer?

- Vamos dizer que não contei toda a história... espero que sua mãe não dê com a língua nos dentes...

- Pode ter certeza que não. Minha mãe não é fofoqueira...

- Ainda bem que a sua família vai cuidar dela prá mim... e tomara que a gente ache esse cabra logo... preciso do dinheiro prá levar ela prá cidade grande... o doutor disse que quanto mais cedo levar ela prá um hospital, mais chances ela tem de sarar...

- A gente vai conseguir, você vai ver...

- Tomara Deus que sim...

- Será que ele é bonito?

- Ele, quem...

- O Juvêncio, ora essa...

- Não sei... deve ser... pelo menos é assim que eu imagino que ele seja...

- Mas porque é que ele usa aquela máscara, mesmo?

- Dizem que é sinal de luto... contam que quando ele era mais moço um bando invadiu o arraial onde ele morava e mataram toda a sua família. Ele não estava em casa, estava na lida de gado... quando chegou e viu o que aconteceu, jurou que iria pegar os responsáveis por aquilo... colocou a máscara e começou a perseguir os bandos de malfeitores que encontrava...

- E ele conseguiu se vingar?

- Quem vai saber? O certo é que até hoje ele continua a cavalgar por esse sertão, fazendo justiça para o povo...

- Será que ainda é novo?

- Dizem que tem mais ou menos uns quarenta anos...

- Já tá velhinho...

- Tá brincando, né?

- Brincando? É só você olhar as pessoas ao nosso redor... vinte e cinco, trinta anos... e já estão todos acabados...

- É, a vida no campo não é fácil... mas o Juvêncio não usa a enxada no seu trabalho...

E as duas ficaram caladas novamente. Graça pegou mais uma broa de milho e enquanto mastigava o alimento, sua expressão era de uma alma ausente. Maria ficou a fitá-la, se perguntando o que se passava pela cabeça da amiga. Em dado momento se perguntou sobre o que se passava em sua cabeça, uma vez que estava ciente de que não tinha nenhum traquejo para cumprir a missão que ela e sua amiga abraçaram... seu pai tinha razão... o que fariam quando encontrassem sua presa? Ela teria coragem de atirar contra o homem, se necessário fosse? Ou ficaria paralisada pelo pavor, uma vez que  simplesmente não suportava o barulho do estampido de uma arma? Não, tinha que tirar essas ideias malucas de sua cabeça. Já que havia decidido tomar esse caminho junto com a amiga, iria até o fim...

- O que a gente faz agora, Graça?

- Que tal dar uns tiros e ver se conseguimos acertar alguma coisa?

- Tá maluca...

- Não, é sério... a gente tem que melhorar nossa pontaria... vai que a gente precise usar a arma em algum momento...

- Espero que não...

- Maria, a gente vai ter que usar as armas... e vai ter que atirar contra quem estamos perseguindo....

- E você vai ter coragem?

- Mas é claro... quem está na chuva é prá se molhar, minha filha...

- Não sei...

- Olha, se quiser desistir, vai tranquila... a gente está perto de casa, ainda... agora, se resolver me acompanhar, tem que estar preparada para tudo...

Sem falar nada, Maria sacou sua arma e atirou... Graça ficou estupefata, sem entender o que havia acontecido. Maria estava lívida, todo o sangue de seu rosto parecia ter sumido de repente. Aos poucos a cor foi voltando às suas feições, e ela foi baixando a arma lentamente. Graça correu em direção à amiga, pois essa estava visivelmente em choque por sua ação...

- O que aconteceu,  Maria? Por que quase me matou, sua louca?

- Olha lá perto de onde você estava...

Graça se voltou e olhou... e ficou assustada, por um momento. A poucos passos do local em que se encontrava, uma serpente dava seus últimos trejeitos, com a cabeça estilhaçada pelo disparo de Maria... a garota acabara de salvar a vida da amiga...

- Uau...

Foi tudo que Graça conseguiu dizer... enquanto isso, Maria trocava a capsula deflagrada por outra...

- Menina, não sabia que você atirava tão bem assim...

- Eu não sei atirar... foi tudo de repente... eu vi a cobra armar o bote contra você...

- Graças a Deus que você acertou ela e não eu...

- Amém... vamos sair daqui...

Desmontaram o acampamento, guardaram suas coisas, selaram seus cavalos, montaram e partiram novamente, por enquanto sem nenhum rumo definido...   as duas cavalgavam em silêncio, pensativas... o primeiro obstáculo que enfrentaram veio em forma de uma serpente venenosa, que por pouco não fizera com que sua odisseia acabasse ali mesmo... não era um inicio muito promissor...

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

QUEM SOMOS NÓS?

23 - A NEW DIRECTION

SELF-ACCEPTANCE