20 - A CAÇADA

 

 


 

 20 - A CAÇADA



Zacarias e seus dois companheiros estavam cavalgando quase o dia todo. Uma onça estava atacando o rebanho, e acharam por bem procurar as pistas que levassem ao animal. Mas não estavam sendo bem sucedidos. O bicho parecia ter pacto com o demo! Por mais que batessem as pistas, não conseguiam encontrar nem sinal da passagem do bichão. Bem, pelo menos ela estava atacando apenas as reses… sim, o prejuízo era grande para a fazenda… já tinham perdido umas cinco cabeças… mas nenhuma pessoa havia sido atacada...ainda. É certo que a onça evitava confrontar o homem, pois ela sabia que estaria em desvantagem… afinal, os homens levavam em suas mão o trovão que feria, e o gatão não gostava muito da ideia de enfrentar aquele fogo estranho…

A noite estava caindo e resolveram dar uma parada, para suas montarias descansarem um pouco… e eles também… mal apearam e Juca já foi pegando as panelas que estavam penduradas em sua sela. Pegou um pouco de pó de café, a carne seca que estava no alforje e um pouco de farinha para acompanhar a refeição frugal que fariam naquela noite. Não pretendiam retornar para suas casas essa noite. Não. Tinham que encontrar a onça, nem tanto pelo gado, mas pelo perigo de uma hora atacar algum desavisado que cruzasse seu caminho.

Haviam parado próximo de um lago, pois sabiam que o animal teria que procurar por água durante a noite, que era sua hora de caçar… só teriam que ter paciência. Logo o cheiro forte do café se espalhou pela planície e os três amigos atacaram sua refeição. Comeram, tomaram seu cafezinho, Tonhão começou a enrolar um cigarrinho, quando Juca pediu que não o fizesse, pois poderia espantar a caça. Zacarias discordou. Afinal, se o cigarro do rapaz espantasse a onça, e sua comida? E o café? O cheiro desses dois era muito mais forte que o fumo de rolo que Tonhão estava picando, para tirar umas baforadas. Depois de pensar um pouco, Juca viu que seu amigo estava certo, e deixou seu parceiro fumar em paz. Resolveram se revezar para o descanso, uma vez que de nada resolveria os três ficarem acordados… o primeiro turno coube a Tonhão… ele tinha certeza de que resolveram castigá-lo por resolver fumar naquela hora, mas depois de pensar um pouco, chegou à conclusão de que o seu era o melhor turno de guarda. Afinal, se o bichão não aparecesse, depois que o rendessem poderia dormir tranquilo…

As horas passavam lentamente, a lua parecia não se mexer no céu. Mas eles eram pacientes e ficariam de tocaia à noite toda… Mais ou menos a meia noite Zacarias veio substituir o rapaz. Tonhão agradeceu e tratou de puxar seu pelego sobre si, para mergulhar no mundo dos sonhos. E Zacarias ficou ali, rifle em riste, pronto para atirar tão logo avistasse a fera. Até tinha dó do animal, pois sabia que o bicho só caçava para poder matar sua fome, mas tinha que pegar justo o gado que estava sob sua guarda? Para azar dele, não teria outra chance de atacar o gado da Santa Helena novamente. Não… tanto Zacarias quanto seus companheiros estavam prontos para dar um fim nas caçadas daquele animal…

Não era a primeira vez que Zacarias tinha que caçar e matar um predador da noite. Ele tinha dó do animal, mas o que poderia fazer? Se pelo menos o bicho se contentasse em caçar os animais que viviam na floresta… mas, não! Assim que localizavam um rebanho, começavam a atacá-lo. Claro que as perdas no inicio eram insignificantes… uma rês por semana. O bichão só voltava para buscar outro depois que devorava completamente a carcaça do primeiro que havia capturado. A vez que Zacarias mais sentiu em dar cabo de uma onça foi quando acertou uma fêmea que dera cria pouco tempo antes… a caça era para matar a fome de seus filhotes. Sentiu pena, mas isso não o impediu de matar a família toda. Tanto a onça adulta quanto seus filhotes acabaram visitando os verdes campos do Paraíso muito antes do combinado. Afinal, ele tinha que garantir a segurança do gado de seu patrão...

Sim, ser guardião de um rebanho exigia certas ações e nem sempre seu coração concordava com elas, mas a razão falava mais alto. Podemos dizer que Zacarias ficou bem mais de um mês com a sua consciência pesada pelo ato que tinha cometido. Ele amava a natureza e era a favor de deixar os animais viverem em paz. Mas se começassem a dar prejuízo para o patrão... bem era o pescoço dele ou dos animais... e é claro que ele optava por se manter forte e saudável... vinha o arrependimento pelo ato cometido? Sim, claro que sim... não tinha como não se arrepender por ter exterminado uma família inteira de felinos como ele tinha que fazer de vez em quando.  Mas a vida seguia em frente e seu arrependimento ias passando, junto com o tempo que tudo apaga...

Devia fazer uma hora que Zacarias estava de tocaia… um pouco mais, um pouco menos… quando percebeu uma movimentação por entre as folhagens. Imediatamente ficou em alerta, pois poderia ser a onça que estava se aproximando. Pegou o rifle, colocou em posição de atirar, massa de mira na alça de mira, dedo no gatilho, pronto para disparar… então…

Zacarias estava preparado para quase tudo, mas não para aquilo. A mais ou menos uns cem metros de onde ele estava, um ser estranho, esquisito mesmo, surgiu farejando o ar. Zacarias tentou identificar que tipo de animal era, mas não se parecia com nada que ele conhecesse. Estava de pé, como um homem. Mas com certeza não era um. O corpo todo peludo, a cara semelhante à de um grande morcego, braços finos e compridos e unhas que pareciam garras… era realmente algo difícil de se acreditar que existisse. Com muito cuidado para não fazer barulho, Zacarias tratou de despertar seus parceiros. Quando viram o estranho ser, quase soltaram uma imprecação. Mas o rosto sério de Zacarias os fez compreender que “aquilo” não os tinha localizado, ainda. E todos ficaram na posição de tiro, prontos para mandar fogo no estranho ser assim que seu líder ordenasse.

Depois de algum tempo farejando o ar, a estranha criatura começou a caminhar em direção ao local onde as reses dormiam. Foi aí que Zacarias entendeu… não era atrás de uma onça que eles estavam… sua caça era aquele ser saído de algum pesadelo...


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