33 - COISAS DE MULHER

 

 


33 - COISAS DE MULHER

 

 Graça estava preocupada com sua amiga. Afinal, desde de manhã que ela estava sentindo cólicas... teriam que fazer mais uma parada, pois sabia que sua parceira não estava em condições de prosseguir... bem, fazia parte do jogo, afinal uma vez por mês isso tinha que ocorrer... mas as dores tinham que vir de forma tão violenta, assim? Naqueles dias Maria simplesmente não conseguia fazer nada, pois  sentia como que seu corpo simplesmente não lhe pertencesse... Graça pediu à amiga um pouco de paciência, estavam perto de um vilarejo e logo estariam em uma pousada... uns três dias  de descanso era tudo o que Maria precisava.... e era isso que fariam... caramba, quando teve a ideia de sair atrás do Zé Ferreira não pensou que teria tanto trabalho pela frente... o pior é que já estavam na estrada a mais de um mês, e ainda não tinham nenhuma pista do sujeito.... ela já estava desanimando. Principalmente porque desse mês apenas duas semanas foram realmente usadas para seguir a pista de seu procurado... as outras duas, tiveram que se virar com seus "problemas femininos"... Graça até conseguiu superar a sua semana, sem sofrer tanto, mas Maria era mais delicada e acabou desabando.... é, as coisas não estavam fáceis para as duas...

Finalmente chegaram à cidadezinha e logo procuraram a hospedaria do lugar. Não era muito convidativo, o estabelecimento. Mas era a única opção que tinham, então lá foram as duas. Graça alugou um quarto por uma semana. A dona da hospedaria era uma senhora já de idade, muito simpática, contrastando com a primeira impressão que as moças tiveram do lugar. Ao ver a situação de Maria, dona Malvina - era esse o nome da dona da pensão - tratou de levá-la a um dos quartos, deixou-a o mais confortável possível e tratou de preparar um chá de gengibre para a moça beber. Vendo sua amiga sendo cuidada, Graça resolveu dar uma volta pelas redondezas, a procura de qualquer coisa que servisse de norte para sua busca. Depois de algum tempo deu sorte. Descobriu que sua caça havia passado por ali a poucos dias. Estava indo em direção a Cunha, onde se integraria a uma comitiva que levaria um rebanho até Igaratá, perto de Jacareí... ela não tinha certeza se conseguiria interceptar o sujeito antes que chegasse ao seu destino... bem, ela tinha certeza de que não conseguiria, uma vez que Maria ficaria pelo menos uns dois dias ainda até passar "seu período"... não era nada assim tão desastroso. Afinal, elas teriam a chance de cair na alma de sua caça, nem que fosse depois que ele terminasse sua viagem até Igaratá... e, pensando bem, deixar para capturá-lo no final da viagem seria até mais tranquilo... afinal, com o bolso cheio, com certeza ele iria se embebedar... e aí seria muito mais fácil surpreende-lo...

Enfim, as duas voltaram para a estrada, depois de quatro dias de recesso. Despediram-se de dona  Malvina, que as tratou como filhas enquanto estiveram sob seu teto. Muito atenciosa, não se descuidou de Maria nem um segundo, enquanto esta passava por seu período... Maria já estava bem disposta, e preparada para ir até o fim do mundo, se necessário fosse. Mas é claro que não precisaria ir tão longe. Afinal, de São Bento do Sapucaí, onde se encontravam, até Igaratá seria um longo percurso, mas avançariam mais rápido que Zé Ferreira, que estava acompanhando a boiada. Mesmo Cunha ficando mais próxima do destino, vencer as montanhas com o gado exigia que seguissem em passo lento, diferente das duas que poderiam imprimir uma velocidade um pouco maior em suas montarias... com certeza chegariam com uma boa folga em seu destino, e teriam tempo de planejar como fariam a captura. Maria estava animada, o ar das montanhas realmente lhe fazia bem. E o clima agradável, aquele cheiro das folhas que o vento trazia, era uma coisa inebriante.  O som da passarada fazia com que se sentissem bem, como se no paraíso estivessem. As borboletas esvoaçavam por todo o lugar, como em um balé mágico, acompanhadas pelas abelhas e outros insetos voadores. De vez em quando, um pássaro fazia um voo rasante. Pequenos animais se escondiam durante sua passagem. Sim, a natureza era bela e trazia para as duas uma mensagem de otimismo... tudo daria certo para elas...

Já estavam no meio da jornada... entre o nada  e o lugar nenhum.. quando Graça notou que seu cavalo começou a mancar. Preocupada, desmontou e foi examinar a pata do animal. Uma expressão de desânimo tomou conta de seu rosto. Seu cavalo havia perdido uma ferradura. O problema é que estavam longe de qualquer centro habitado, e o animal teria que prosseguir do jeito que se encontrava. É claro que ela não poderia continuar montando seu cavalo... então a viagem acabaria demorando mais do que o previsto... Maria a puxou para sua sela, e foram caminhando devagar, para não forçar a montaria... 

Havia se passado um dia, desde que Graça percebeu que sua montaria havia perdido a ferradura, e finalmente adentraram em um vilarejo. Foram direto ao ferreiro, pois tinham que recolocar a ferradura no animal. Deixaram os dois aos cuidados do ferreiro e foram procurar um lugar para comer e descansar... e tomar um banho também, por que não? Afinal, estavam com poeira acumulada de uns três dias sobre o corpo... o caminho que fizeram não tinha nenhum riacho por perto...

Como não estavam assim com tanta pressa de voltar à ativa... mesmo porque o ferreiro já adiantara que demoraria um pouco para cuidar dos seus animais... as duas moças resolveram dar uma volta pelo vilarejo. Visitaram algumas lojas, sendo uma delas de artigos femininos, é claro. Maria ficou encantada com um dos vestidos que estavam em exposição. O preço era um tanto salgado, afinal era uma roupa feita para as senhoras dos dirigentes da cidade... políticos e fazendeiros. Mas como olhar ainda era de graça...  Graça deu de ombros... já havia se acostumado com as roupas que estava usando nos últimos dias... sentia-se mais confortável usando as calças de vaqueiro do que as saias e anáguas que tanto encantaram Maria. Sim, sem dúvida a indumentária que ora usava era bem mais prática... não precisava ficar se policiando ao sentar-se, por exemplo... mas sua amiga realmente ficou encantada com as roupas que vira...

- Pode deixar, Maria... depois que pegarmos o Ferreira, você terá dinheiro para comprar essa loja toda...

- Ora, eu...

- Calma, menina... eu sei que você gostou de tudo aqui... afinal, são coisas de mulher...

- É tudo muito lindo, não é?

- Sim, amiga... é tudo muito lindo... mas a gente só vai ter dinheiro para ver essa lindeza toda depois que completarmos nossa missão...

- Acho que já está na hora, não?...

- Creio que sim... vamos?

E assim, banhadas, alimentadas, descansadas... refeitas da jornada até ali, as duas se dirigiram ao ferreiro, para pegar seus animais. Estes também estavam descansados, bem alimentados e prontos para reiniciar a jornada. Pagaram os serviços do profissional, colocaram as selas em seus cavalos, montaram e saíram novamente pela estrada afora.... ainda tinham muito chão para percorrer...


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