A TAÇA DE CRISTAL - Capítulo Sessenta e Um
A TAÇA DE CRISTAL
Capítulo Sessenta e Um
O carro já passara pela entrada de Cachoeira Paulista e continuava a seguir adiante. Helena resolveu que só sairia da Rodovia quando alguém do carro se manifestasse. Quando estavam próximos à Rodovia dos Tropeiros, veio o pedido... e quem o fez? Cecília. De repente ela sentiu vontade de conhecer Bananal... claro que houve protesto generalizado dentro do carro, pois o combinado era seguir para a serra... mas, de repente, mudou-se o percurso e começaram a seguir em direção do Sertão de Bocainas... Não tinham ainda um destino previsto, Helena resolveu deixar sua irmã guiá-la pela estrada.
- Mas a gente não ia para a Mantiqueira?!
- A gente ia para a região do Vale... Bocainas é Vale...
- Sim, mas...
- Gente, esse passeio é da Ceci... deixem-na escolher o roteiro...
- Já sabe para onde vamos, Ceci?
- Na verdade, não, papai... mas de repente me deu vontade de seguir essa rodovia...
- Por que, meu bem?
- Acho que tem a ver com meu sonho... sei lá... de repente senti uma necessidade incontrolável de vir para essa direção...
- Por causa de sua bisavó?
- Por que?
- Bem, essa era uma das regiões em que ela e suas parceiras costumavam cavalgar...
- Sério?
- Sim... segundo se contava na família, Isabel se envolveu em vários casos nessa região...
- Nossa... o senhor lembra de algum?
- Agora, não... mas se me lembrar de alguma história, conto para vocês....
- Lá vem você com essa lenga lenga, Mario...
- Que lenga lenga, Jane?
- Essa história dessa tal Isabel... prá mim, ela nem existiu....
- Tanto existiu, que era mãe da minha avó... está certo que largou a família e se embrenhou pelo sertão... mas só ela poderia explicar suas razões...
- Se ela existiu, era uma mãe desnaturada. Onde já se viu, abandonar duas crianças pequeninas?
- Como eu disse, Jane... só ela poderia justificar seus atos... a gente não temo como saber o que de fato aconteceu naquela época...
E deram por encerrado o assunto, passando a admirar a paisagem que se descortinava à sua frente. Passaram por Silveira, Areias, chegaram até a divisa do Rio, sempre em frente. Depois de passarem por Arapeí, a próxima cidade era Bananal... Cecília pediu para sua irmã entrar na cidade...
- Mas por que Bananal, Ceci?
- Que diferença faz? Mas de qualquer forma, não sei por que, me deu vontade de conhecer essa cidade...
- Papai, o senhor que sabe de tudo... por que a cidade se chama Bananal? Tem muita bananeira por aqui?
- A bem da verdade, o nome da cidade não tem nada a ver com a fruta...
- Não?!
- Não... vocês sabem que nosso idioma tem uma influência muito grande dos povos nativos da terra... Bem, essa região era a terra dos índios Puris... na verdade, seu aldeamento vinha desde a Mantiqueira até aqui. Bananal vem do termo "Banani", que em seu linguajar queria dizer "rio sinuoso"... quando fundaram a cidade, virou "Bananá" e depois, "Bananal"....
- E viva o senhor Mario, nossa enciclopédia ambulante...
- Gente, eu nasci nessa região... está certo que lá pras bandas da Serra, mas ainda no Vale... é minha obrigação conhecer um pouquinho da história deste rincão, não acham?
- Não sei... nasci em São Paulo e sei tão pouco sobre a cidade...
- Helena, no kilômetro 24,5 da 247 tem uma pousada muito boa... vamos para lá?
- Por que não, papai? Essa viagem está sendo feita no improviso, mesmo...
- Vocês vão gostar de lá, tenha certeza...
E assim seguiram para a pousada Villas da Bocaína...
A tarde, logo depois do almoço, resolveram visitar a Cachoeira do Bracui, localizada na Serra da Bocaína, dentro de um trecho da Mata Atlantica. Da cachoeira, uma visão incrível da Baía de Angra dos Reis... sim, o passeia valia a pena, mesmo que a taxa de visitação fosse um pouco salgada. As águas da cachoeira iam em direção ao Rio de Janeiro... bem, Angra fica no Rio, não é mesmo? Depois de se maravilharem com a visão do cachoeira, depois de fazerem o caminho de volta pela trilha...aliás, Janete reclamou um pouco, embora também tenha se encantado com a visão... retornaram para sua pousada. Estavam planejando o passeio do dia seguinte. A família havia decidido, sem que tivessem externado o pensamento, que essa semana seria dedicada exclusivamente a Cecília... seria uma tentativa de reanimar a moça, que realmente esta muito desanimada, ultimamente. Claro que ninguém falou isso para ela, faziam tudo como se por acaso fosse. Mas o centro de todas as atenções era realmente Cecília. Tanto Mario quanto Helena pediram uma licença de quinze dias em seus empregos para fazer essa peregrinação, na tentativa de levantar o moral da moça... e, pelos sorrisos e brilho no olhar durante o passeio, eles diriam que a estratégia estava funcionando. Helena perguntou para a irmã o que ela queria fazer no dia seguinte e sem pensar duas vezes, disse que queria conhecer a Estação Ecológica de Bananal. Inquirido se sabia alguma coisa sobre o local, Mario explicou que a estação foi criada em 1987, contando com 884 hectares, sendo um dos ultimos parques com a Mata Atlantica ainda preservada, e que nesta viviam várias espécies em risco de extinção, entre eles o mono-carvoeiro e o bugio, várias espécies de aves, entre elas o gavião-pombo e o gavião-pega macaco, os porcos caetetus e o queixada, e a estrela do parque, a onça pintada. Além disso, dentro do parque encontrava-se preservado um trecho de 800 metros da trilha do ouro, construída a mais de trezentos anos por mão de obra escrava, toda calçada por rochas... foi quando Cecília falou...
- Foi nessa estrada que a bisa Isabel lutou sua ultima batalha...
Todos olharam para ela, espantados...
- De onde você tirou isso, Ceci?
- Ela pode ter razão, Helena... na verdade, quando Isabel morreu, ela e suas companheiras estavam nessa região, atrás de um bando que infernizava toda a região...
- O senhor conhece essa história, papai?
- Não, meninas... como falei antes, a gente não sabe muita coisa sobre Isabel e suas parceiras... elas iam para onde eram chamadas... e, como eu disse, quando Isabel foi abatida, ela e suas amigas estavam nessa região...
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