A TAÇA DE CRISTAL Capítulo Cinquenta e Cinco


 

A TAÇA DE CRISTAL

Capítulo Cinquenta e Cinco

 

 

Cecília estava sentada no banco da praça, próximo da casa de seus pais. Estava pensativa. Tinha que tomar alguma atitude com relação ao seu destino, porém não sabia que rumo tomar. Estava preocupada com seu ex... é verdade que já fazia alguns dias que não mais tinha notícias dele, e esperava que continuasse assim por muito tempo. Bem, pelo menos ele estava trabalhando...  a única coisa que ela tinha que fazer era ficar o mais distante possível dele... estava inclusive aventando a hipótese de mudar-se novamente de cidade. Não era uma decisão fácil de tomar, pois sua vida estava toda organizada novamente. Mas, se não conseguisse encontrar outra saída, teria que partir para essa solução. Quem sabe se, ficando um bom tempo longe de todos os conhecidos, Ricardo esquecesse um pouco essa obsessão que desenvolvera por ela...

- O que foi, Cecí?...

- Juro que não sei o que faço, Estela ... por um lado, o Ricardo me preocupa...

- Sério? Por que?

- E ainda pergunta? Ele simplesmente encarnou minha alma...

- Você não acha que...

- Não sei, Estela... juro que não sei... de qualquer forma, tenho que tomar algumas decisões em minha vida...

- Tipo?!!

- Tipo decidir o que vou fazer... sei lá... talvez pegar um ônibus e desaparecer novamente...

- Será que fugir é a solução?

- É essa a pergunta que estou me fazendo, nesse momento... e não consigo encontrar uma resposta que me satisfaça...

- Queria te dizer que te entendo... mas não seria verdade....

- Eu sei, maninha... obrigada por me ouvir...

- Vamos entrar? Está esfriando um pouco...

- Não... vou ficar mais um pouquinho por aqui... como disse, preciso pensar...

- E se "ele" aparecer?

- Vai me ajudar a tomar minha decisão mais rápido...

- Bem, então tchau por enquanto...

Era pouco mais de oito horas quando Roseli tocou a campainha da casa de Ricardo. Com uma cara de poucos amigos, ele abriu a porta. Ao vê-la, limitou-se a convidá-la para entrar,  sem demonstrar qualquer tipo de satisfação em recebê-la...

- Nossa, Ricardo... que cara é essa?

- É a única que tenho...

- Não precisa ser tão grosso, né?

- Esse sempre foi meu charme... você gostava de mim justamente por eu ser grosso...

- Sem piadinhas de duplo sentido, por favor...

- Está bem... o que você quer?

- Nossa... cada o cavalheirismo? A gentileza?

- Acho que já passamos dessa fase...

- Ferradura nova?

- Rose, o que você quer?

- Faz mais de quatro meses que nos separamos...

- Sim...

- Você se acidentou, se recuperou...

- Sim...

- Posso te fazer uma pergunta?

- Faça...

- Fazem dois meses que você voltou para cá...

- Sim...

- E nesse tempo todo você não fez uma única visita para sua mãe...

- E por que eu iria?

- Ué... ela é sua mãe...

- Tá... e daí?

- Ricardo... vai me dizer que você não sente nem um pouco de saudade dela...

- Deveria?

- É a sua mãe....

- Ela tem a vida dela, eu tenho a minha... e está bom assim...                                                                                                             

Roseli ficou desarmada, por alguns segundos... como argumentar com alguém com esse tipo de pensamento? Afinal, ele simplesmente dissera, com todas as letras, que sua mãe não era importante em sua vida... como alguém podia pensar dessa maneira, meu Deus? Afinal, se você não tem consideração por aquela que lhe deu a vida, o que se pode esperar de suas ações?..

- Sabia que Letícia anda um pouco doentinha?

- É claro que não...

- Vai visitá-la?

- Está internada?

- Não... está resfriadinha...

- Doença de criança...nada de anormal...

- Mas ela quer te ver... vive chamando por você...

- Que novidade é essa, agora?

- Ela sempre foi muito apegada a você, Ricardo...

- Comecei a trabalhar esses dias... no momento, estou sem tempo.... assim que pegar uma folga, dou uma passada por lá...

- Eu...

- Queria me dizer mais alguma coisa?

- Não, eu...

- Então me desculpe, mas eu já estava indo dormir... tenho que levantar as quatro da manhã...

E assim, dessa maneira "delicada", Ricardo mandou sua ex embora. Enquanto a porta se fechava atrás da moça, mil pensamentos passavam pela sua cabeça...  sim, ela tinha razão... a muito que devia uma visitinha à sua mãe e também à sua filha... mas não tinha ânimo para fazer uma visita a quem quer que fosse... não até resolver de uma vez por todas sua situação com Cecília... que diabos... os dois ainda eram casados... ele tinha os seus direitos... e se Cecília continuasse a evitá-lo dessa forma, ele iria correr atrás da lei... afinal, ele merecia uma explicação...

Roseli saiu da casa de Ricardo realmente preocupada. Pelo pouco que conversaram, ela sentiu que seu ex realmente não estava bem... o ideal era levá-lo a um psicólogo, um psiquiatra... mas como poderia fazer isso? Bem, se ele realmente fosse visitar sua filha no dia de sua folga, e se ela estivesse em casa, tentaria levar a conversa para esse lado e veria o que era possível fazer.

Milagre ela sabia que não dava para fazer, então  o negócio era usar as cartas que tinha nas mãos. Mas ela estava ciente de uma coisa...se Ricardo não recebesse uma ajuda o mais breve possível, ele entraria em curto e aí... só Deus para saber o que ele faria...    

Roseli tomou o ônibus e uns quarenta minutos depois já estava em sua casa. Dona Olga estava brincando com a netinha na sala e, quando a viu entrar, foi logo perguntando...

- E então?

- A senhora tem razão... mas uma coisa eu te digo...

- O que, minha filha?

- Se a gente não ajudar o Ricardo, ele vai entrar em parafuso...

- Rose, não dá para ajudar quem não quer ser ajudado...

- Eu sei, dona Olga... mas...

- Você ainda gosta dele, não é mesmo?

Roseli enrubesceu... sim, apesar de ter sido ela a romper a vida conjugal com Ricardo, ainda o amava... mas de que adiantava isso, se o coração dele pertencia a outra pessoa? Além disso, ela não tinha vocação para Amélia... jamais ficaria ao lado de uma pessoa que não a respeitava... e Ricardo já provara, por várias vezes, que não respeitava ninguém... dona Olga olhava para ela com pena... era como se a velha senhora conseguisse ler os pensamentos de sua nora...

- Sabe, Rose...para mim você seria a mulher ideal para o Ricardo... mas o destino não concorda comigo, fazer o que, não é mesmo?       

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