WALKÜREN - AS TRÊS MARIAS Capítulo Cinquenta


 

WALKÜREN - AS TRÊS MARIAS

Capítulo Cinquenta

 

- Já decidiu o que fazer, delegado?

- Sim... vou patrulhar as redondezas da cidade, esta noite.

- Sozinho?

- Não. Com um bom estoque de balas de prata e a companhia das três moças...

- Não acha perigoso levá-las junto?

- Santana, elas são a chave para resolvermos esse problema...

- Sim, mas...

- Se tenho alguma chance de descobrir o que caminha pela planície a noite, é na companhia dessas três.

- E mais quem?

- Bem, se tiver algum voluntário, será muito bem vindo...

- E a que horas vão partir? 

- A gente vai descansar um pouco e lá pelas onze, meia noite saímos para a pradaria...

- Acho que o doutor Carneiro também vai querer ir...

- E o senhor, não?

- Está brincando? Eu e o Torquato não perderíamos essa expedição por nada desse mundo...

- Doutor Santana está certo, seu Juvêncio... a gente quer ver esse tal de dino qualquer coisa...

- Então a gente se vê mais tarde....

E assim o grupo de amigos encerrou a conversa, indo cada um para seu canto, cuidar dos afazeres do dia. Santana e Torquato foram cuidar  da delegacia, Carneiro foi ter com dona Marieta. Deixou tudo em suas mãos e foi para casa, descansar. Iria cavalgar sobre uma sela depois de muito tempo de usufruir do conforto de uma charrete. Mas  tudo em nome da ciência. Ele tinha esperança de conseguir capturar o tal dinossauro avistado por Juvêncio e Torquato. Se conseguisse tal proeza, ficaria famoso. E quem não deseja ser famoso, não é mesmo?

As três moças a muito já estavam descansando, se preparando para a ronda noturna. Juvêncio tratou de se recolher. É claro que em sua juventude ficava dias e dias sem dormir, atrás de suas presas. Mas hoje tal ato era desnecessário.  Já tinha verificado suas armas, providenciou uma boa refeição para Tornado... estava tudo pronto para o momento que iriam sair em campanha.

A noite finalmente caiu. Eram umas oito da noite quando o grupo se reuniu na pensão, não só para fazer a refeição noturna, como para decidir como iriam agir... Depois de se alimentarem e verificarem seus equipamentos, o grupo saiu em direção ao estábulo, buscar suas montarias. Todos armados, com suas armas municiadas com balas de prata. Porque? Bem, iriam enfrentar forças do além, e a sua única defesa era a prata. Sim, eu sei que em alguns casos costuma-se usar um crucifixo, também... mas, como Juvêncio falou....

- A besta é pagã, minha gente! Vamos torcer para que as balas de prata funcionem....

E assim, após verificarem os arreios e conferir as cargas dos alforjes, todos montaram e saíram em fila, em direção a campina.  Era noite de Lua Cheia e a claridade se espalhava pelo campo. Estavam quase nos limites do povoado, quando ouviram um tropel em sua direção. Todos se voltaram para ver quem era... e...bem, Dona Matilde, a diretora da escola também resolveu participar da caçada.

- Mas a senhorita...

- Delegado, essa seria a visão de minha vida! Por favor, deixe-me participar!

- Mas...

- Olha, se não fossem minhas pesquisas, vocês ainda estariam andando em círculos... por favor, me deixa ir...

- Mas é perigoso para a senhorita....

- E para elas, não?

- Bem, as três moças estão acostumadas a participar desse tipo de ... caçada!

- Eu gosto de aventura...

- O problema é que, se as coisas ficarem feias, não tem como a gente te proteger....

- Me arranja uma arma... eu sei atirar....

Vendo que não tinha como demover a professora de seu desejo de caçar fantasmas, Juvêncio entregou-lhe o rifle que trazia no coldre de sua sela...

- Por favor, tome cuidado...

- Fica tranquilo, delegado... eu sei manusear uma arma, já falei...

Depois de uma hora mais ou menos, o grupo estava bem afastado dos arredores da cidade. A partir daí começaram a ser mais cautelosos, armas em punho, prontos para disparar ao menor sinal de perigo... em um determinado momento Juvêncio gesticulou e todos pararam. Ele apeou, começou a examinar o solo... fez sinal para que todos desmontassem... e então conduziram os animais com toda cautela... aparentemente, a caça estava mais próxima que o desejável...

O  primeiro a notar algo estranho foi Santana. Ficou estático por alguns segundos, então, lentamente, bateu de leve no ombro de Juvêncio, que estava um pouco a sua frente. O delegado olhou para o parceiro e, logo em seguida, para o ponto que o mesmo estava olhando. Então notou uma luz azulada, característica das aparições do além, a alguns metros de distancia do local onde se encontravam. Fez sinal para que todos se abaixassem e ficassem em silêncio, apenas observando o que acontecia.

Devagar, quase que como se o tempo estivesse congelado, a figura de um monstro foi se formando no lugar da estranha luminosidade. Primeiro, apareceu o lagartão, como Juvêncio resolveu chama-lo. Depois, quase em sequência, um estranho ser, com mais ou menos um metro e noventa de altura... talvez uns dois metros... também foi surgindo. Estava ao lado do lagarto. Eu disse "estranho ser" porque, além do mesmo ser brilhante, aparentemente tinha penas por todo o corpo. Aliás, foi isso que Dona Matilde exclamou baixinho... mas o som foi suficiente para deixar o ser em alerta.

Quando o mesmo virou-se  na direção onde o grupo se escondia, puderam perceber que era um humanoide, mas como Juvêncio havia aventado antes, havia uma protuberância em seu rosto, semelhante a um bico.... bem, com certeza, não era uma seriema...

Os olhos do estranho ser eram vermelhos, tão vermelhos que pareciam duas bolas de fogo. O... bico... era seu nariz, com um comprimento assaz avantajado. Em uma comparação bem infeliz, poderíamos dizer que se parecia com uma tromba de elefante... ou então, com o focinho de um tamanduá. Não dava para ver a boca do mesmo....

Anhangá (vamos chama-lo assim, já que não temos um nome melhor) perscrutou todo o seu redor, a procura de qualquer coisa estranha...   o grupo, ao perceber a falha da professora, tratou de fazer o mais absoluto silêncio, e a fera não conseguiu localiza-los. Depois de procurar e nada de estranho encontrar,  montou em seu fiel Jurupari e saíram em disparada. Juvêncio e sua turma ficaram imóveis ainda por algum tempo, e só quando tiveram certeza de que os monstros não estavam mais nos arredores é que voltaram a se movimentar...

- Não devíamos ter atacado a fera, Delegado?

Era Matilde, questionando a passividade do grupo, frente a visão de sua caça...

- Dona Matilde, a gente tem que entender o que estamos caçando, primeiro...

- E, enquanto isso, morrem mais inocentes! Pensei que o senhor era mais valente!

A decepção estava estampada no rosto de Matilde. Para ela, o fato de não terem atacado a besta quando a oportunidade surgiu, denotava covardia... e ela não esperava que Juvêncio fosse covarde, devido à fama que o mesmo tinha pelos sertões...

- Já disse alguém certa vez... não queira conhecer seus heróis... eles vão te decepcionar...

- Dona Matilde, me desculpe... mas não era a hora certa para atacar a fera...

- Ah, não? E quando seria? Depois que ele fizesse uma nova carnificina, como tem feito nos últimos dias?

- Eu entendo que a senhora esteja chateada. Mas atacar às cegas não é a solução...

- Ah, não?!...  E poderia me dizer, por favor, qual seria essa... solução?

- A gente tem que conhecer o inimigo primeiro, antes de atacar, Dona Matilde. Me diz uma coisa... a gente atirava nos dois seres que apareceram em nossa frente... e se tivesse mais algum, em algum canto por aqui?

- Mas não tinha, delegado!

- É mesmo? E como a senhora pode afirmar isso?

Izabel intervém na discussão dos dois pois percebe que, se não o fizer, a querela se prosseguirá por um bom tempo.

- Professora, com todo respeito que eu tenho para com a senhora, por favor, cale a boca.  O Delegado agiu corretamente. Não sabemos ainda com o que estamos lidando...

- E quem é você, para me mandar calar a boca?

Izabel olha firmemente para os olhos de Matilde. Essa se sente intimidada com a forma que sua oponente a fita....

- Professora, eu sou uma Walkyria. E não pretendo conduzir ninguém aos Campos do Paraíso essa noite...

 

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