WALKÜREN - AS TRÊS MARIAS Capítulo Trinta e Quatro
WALKÜREN - AS TRÊS MARIAS
Capítulo Trinta e Quatro
Doutor Carneiro estava todo animado. Afinal, já faziam
alguns dias que ele não precisava dar um jeito em um cadáver para poder
entregá-lo à família. Já estava quase se sentindo um médico normal, outra vez.
Nada de corpos estraçalhados. E o número de mortos na região paticamente estava
zerado. No momento sua maior preocupação era visitar as famílias e ver como
andava a saúde destas.
Claro que ainda dava seu plantão no Morgue... mas era
uma passadinha rápida pela manhã. Marieta também estava toda empolgada. Afinal,
desde que parou de aparecer cadáveres pelas redondezas da cidade, ela pôde
aprender mais sobre como cuidar de pessoas... vivas.
Estavam visitando uma das várias fazendas localizadas
ao redor da vila. Tudo normal, aparentemente. Marieta, eufórica, examinou
uma das crianças da família. Era a primeira vez que o doutor a deixava tomar a
iniciativa. Claro que ele estava ao seu lado, pronto para orientá-la, caso
necessitasse. Mas a deixava a vontade, pois precisava ter certeza de que sua
pupila aprendera tudo aquilo que ele ensinara.
Quando já estavam para ir embora, um dos garotos da
casa fez um comentário que deixou o doutor preocupado... o garoto comentou que
na tarde anterior o céu ficara com uma cor diferente... o por do sol foi
vermelho azulado! E a noite os animais no pasto ficaram muito agitados. Por que
a preocupação do doutor? Porque foi assim que começou a primeira onda de mortes
na região. Pela altura do sol no céu deveria ser umas três horas da tarde, mais
ou menos. Carneiro não teve dúvidas. Tocou direto para a cidade. Ficou calado o
tempo todo. Marieta respeitou seu silencio. Sabia que, quando fosse a hora, o
doutor exporia o motivo de sua preocupação...
Mais ou menos uma hora depois os dois chegaram à
cidade. Depois de deixar a charrete no estábulo e pedir para o cavalariço
cuidar de seu animal, doutor Carneiro se dirigiu à delegacia. Queria conversar
com o delegado o mais breve possível.
Ao entrar na delegacia, percebeu que Santana estava
chamando a atenção de um munícipe, que estava sendo liberado aquela hora. No
caso o homem havia se embriagado na noite anterior e acabou se envolvendo em
uma briga, onde levou a pior. Só não apanhou mais porque Santana estava
passando perto do bar e interviu na hora. Como, de certa forma, a briga não foi
culpa do oponente, o delegado achou melhor levar Ditão (esse era o nome do
munícipe embriagado)para a cadeia, para curar a bebedeira e os ferimentos.
Quanto à bebedeira... Ditão passou o dia todo dormindo na cela. O delegado não
se importou com isso... pelo menos ali o rapaz não iria arrumar confusão.
Quanto aos ferimentos, doutor Carneiro poderia dar um jeito, já que eram cortes
superficiais...
Quando viu a fisionomia preocupada do doutor, sentiu a
urgência que o mesmo tinha para conversarem. Doutor Carneiro pediu para sua
assistente cuidar do rapaz e, enquanto os dois se encaminharam para a
enfermaria, o doutro sentou-se, em silêncio por alguns minutos...
- Carneiro, o que aconteceu? Por que essa cara, homem?
O doutor continuou calado.
- Se você não falar nada, não vou saber o que o está
afligindo...
O doutor levantou-se, cruzou as mãos nas costas,
caminhou um um pouco pela sala, sempre com aquele ar de preocupação.
Finalmente, virou-se para seu colega...
- Vai começar tudo de novo, Santana...
- O que vai começar, homem de Deus?
- As mortes, Santana... logo a gente vai receber mais
cadáveres...
Santana quase pulou da cadeira...
- Como assim? Como você...
- Os sinais, Santana... os sinais foram vistos
novamente...
- Sinais?!... Está ficando louco, rapaz?
- Não... bem que eu queria estar... mas...
- Vamos fazer o seguinte... senta! Depois se acalme e
me conta tudo, desde o inicio...
Carneiro fez como seu colega e amigo pediu. Sentou-se,
pegou um copo com água, da jarra que estava em cima da mesa, e sorveu todo o
líquido. Ficou mais uns minutos em silêncio, como se estivesse meditando. E
finalmente começou a falar...
- Lembra daqueles fenômenos estranhos que apareceram
no céu, um pouco antes dos ataques iniciarem?
- O céu diferente... os animais agitados...
- Pois é...
- Eu não vi nada disso por aqui...
- Foi lá prás bandas da Ourofino...
- Mas essa fazenda fica quase fora de Pinhal...
- Eu sei... mas ainda está sob nossa jurisdição...
- E...?
- E os moradores da região viram os sinais no céu... e
os animais ficaram agitados à noite... exatamente como da outra vez...
- Diabos... então temos menos de quatro dias para
tentar nos preparar para o que está por vir...
- O que está por vir, delegado?
Era Juvêncio, entrando no gabinete de Santana. Os dois
homens dirigiram seu olhar para ele. Como sempre, trajava uma indumentária
preta, com um lenço vermelho amarrado ao pescoço. Estava com seu cinturão, onde
seus dois revólveres ficavam um pouco baixos, para facilitar o saque, se
necessário...
- Seja bem vindo, Juvêncio... a gente ia te chamar,
mesmo... economizou a sola de minhas botas...
- Que bom que eu ajudei... mas o senhor estava falando
mesmo sobre...?
- Por favor, sente-se. Acho que o senhor tem que ouvir
essa história...
Juvêncio sentou-se e ficou ouvindo Santana e Carneiro
desfiarem os relatos da primeira vez que as coisas começaram a sair dos trilhos
em Pinhal. Ouvia com toda atenção, sem interromper seus interlocutores. No
final...
- E por que vocês não me contaram isso antes?
- Contar o que? Que em uma bela tarde o céu adquiriu
uma coloração estranha? Que durante alguns dias os animais pareciam loucos, de
tão agitados que ficaram?
- Sim. Pode não parecer, mas isso seria muito
importante para mim...
- Mas... o que isso tem a ver...
- Doutor, se eu sei que há um sinal sobrenatural
anunciando o que vai acontecer, tenho mais chances de impedir os fatos
ocorrerem...
- Quando o senhor chegou, as mortes já estavam
ocorrendo..
- Sim, mas alguém se preocupou em dizer-me como elas
iniciaram?
Todos ficaram em silêncio por alguns momentos.
Juvêncio voltou a falar...
- Pessoal, não estamos enfrentando uma situação
normal. Vocês sabem que essas mortes tem um que de misticismo. Então, por
favor, tem que me contar até aquilo que acham que não tem importância...
porque, de repente, aquilo que vocês acham que não quer dizer nada pode ser a
chave para resolver o problema...
- Tudo bem... então... já sabe o que fazer?
- Infelizmente, não... a ajuda que eu preciso, não a
tenho no momento.
- Como assim?
- A algum tempo enfrentei uma situação parecida com
essa... claro que havia muitas diferenças, mas basicamente haviam pontos em
comum. E tive a ajuda de um grupo de pessoas. Nesse grupo havia um trio de
moças que foram cruciais para resolvermos tudo. Pena que não sei onde
encontrá-las... seriam de grande ajuda por aqui...
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