WALKÜREN - AS TRÊS MARIAS Capítulo Vinte e Oito
WALKÜREN - AS TRÊS MARIAS
Capítulo Vinte e Oito
- Juca...
- Que foi, Belinha?
- Sabe, quando eu estava no trem...
- O que é que tem?
- Eu dormi... e sonhei...
- A viagem é longa... é normal dormir... com o que você sonhou?
- Com a primeira vez que encontrei com a Graça... dá para acreditar?
- Acho que sim... mas bem que podia ter sonhado comigo, né?
Izabel jogou seu travesseiro em Juca, rindo...
- A gente não escolhe com o que vai sonhar...
- É, eu sei... principalmente quando não gosta muito do outro...
Ela ficou séria, parou de rir. Estava sentada na cama, olhou para seu parceiro...
- Por que diz isso?
- Mas não é verdade, Belinha?
- Eu gosto de você...
- Acredito... como um irmão!
- A gente não tem filhos com irmãos.
- Você me entendeu.
- Juca... você sabe como eu sou...
- Eu sei! E, se algum dia eu chegar em casa e não te encontrar mais, não será nenhuma surpresa...
- Por quê?
- Porque você é mais ligada às suas amigas do que a mim ou aos nossos filhos...
- Deixa de falar besteira, homem! Faz tempo que não vejo a Rosa! E a Graça... eu precisei de um favor dela.
- Eu sei, Belinha... mas é como eu disse... você é mais ligada a essas duas do que ao Mario ou à Soninha... ou a mim...
Izabel ficou quieta. Sabia que seu marido estava certo. Ela não sentia nenhum tipo de afinidade com a família. Durante os quatro dias que esteve fora da cidade, não pensou nem uma vez em nenhum deles. Em compensação, não deixava de pensar em Graça e Rosa. Mas é claro que não ia admitir isso...
Juca também resolveu não fazer mais nenhum comentário. Sabia que estava certo, mas sabia também que de nada resolveria discutir com a esposa. Era melhor continuar como estavam. O problema é que as crianças também sentiam esse distanciamento da mãe. Nem mesmo nos finais de semana ela passava algum tempo com eles. Quem fazia seu papel no dia a dia era sua irmã mais nova, a Cecília. Tanto que as crianças até já a chamavam de mãe...
O casamento dos dois nunca foi aquele casamento. Desde o início eram distantes, mesmo morando debaixo do mesmo teto. Em sua lua de mel ela ficava fazendo contas e verificando qual seria o melhor local para fundar sua loja. Ela não passou um único dia ao lado do marido, na viagem de núpcias que fizeram a Campos de Jordão. Embora o rapaz adorasse aquele pedaço de chão a moça sempre lhe perguntou porque, ao invés de irem para a terra dos tuberculosos e alcoólatras não viajaram para a Capital Federal, o Rio de Janeiro... ou, no mínimo, para São Paulo...
Apesar de tudo isso, nove meses depois nasceu Soninha. e um ano e meio depois, veio Mário. Mas ela nunca foi uma mãe muito presente...
Tão logo terminou o resguardo e Izabel atirou-se ao trabalho... isso com relação aos dois partos. Apesar de ter criado duas vidas, não sentia nenhum vínculo com estas. Mas não se sentia culpada...
Embora seu casamento fosse apenas de fachada, Izabel tinha um certo carinho por Juca. Mas se perguntassem porque ela se casou com ele, não saberia responder. Isso porque ela mesma não tinha a menor ideia do porque dera esse passo... Sim, estavam casados já a uns cinco, seis anos, tinham dois filhos lindos, gozavam de uma certa estabilidade financeira... mas se perguntassem para a moça se era feliz em sua vida, ela não tinha uma resposta. E isso acabava por tornar o rapaz infeliz, pois ele não conseguia entender porque sua mulher não o tinha como prioridade em sua vida... em primeiro lugar era a empresa. Depois citava as amigas, que a muito não via. e nem uma palavra sobre ele ou as crianças...
Ele só aceitou a situação sem reclamar depois que seu sogro, vendo que a união dos dois estava balançando, chamou-o para o lado para conversarem. Ele ainda se lembrava. Era uma noite da primavera. Zacarias ia guiar uma comitiva de uma cidade a outra e o chamou para acompanhá-lo. A principio estava relutante, mas seu sogro era um homem que sabia convencer. E durante o trabalho, Zacarias conversava com o rapaz e explicava-lhe tudo aquilo que até então ele não conseguira entender...
Os dois estavam cuidando de um dos flancos da boiada, apearam para passar a noite. Zacarias então, depois de distribuir os turnos de guarda entre a peonada, convidou o rapaz para caminharem um pouco, esticarem as pernas antes de se entregarem ao sono dos justos...
- Você e a Bel estão com problemas...
- De jeito nenhum... eu amo sua filha.
- Não foi isso o que eu falei... eu disse que vocês estão com problemas.
- Porque o senhor acha isso?
- Não sou cego, rapaz... vejo o que acontece ao meu redor... e eu vejo que vocês dois estão cada dia mais distantes...
- Não é culpa minha, seu Zacarias... eu amo a sua filha.
- Mas ela não te ama, já deu para perceber.
- O que eu posso fazer?
- Nada. Vocês se casaram porque ela precisava gerar seus filhos... eles terão um papel importante no futuro....
- Não entendo...
- Não é necessário entender... basta saber que todos os anjos estarão velando por vocês...
- E..?
- E chegará o dia em que ela deixará você e seus filhos e partirá junto com suas amigas para cumprir sua missão...
- Então ela está...
- Não, ela não tem a menor ideia sobre qual o seu papel real no jogo da vida....
- Mas...
- Tudo o que te peço, durante esse tempo, é que você tenha paciência...
- Está bem, mas...
- Conseguiu compreender o que terá que fazer?
E desde então tornou-se claro para Juca que ele era um simples peão, que deveria auxiliar sua rainha em tudo aquilo que suas missões necessitassem. E por isso, vivia na sombra da esposa.
E agora, olhado para Izabel... que vontade louca de abraçá-la e cobrir-la de beijos... mas sabia que isso não lhe era permitido... afinal, a moça não sentia nada por ele...
Juca suspirou, como que para espantar seus mais íntimos desejos. Virou-se na cama e fechou os olhos. Estava acordado, mas queria que a mulher pensasse que já caíra no sono. Izabel continuou sentada na cama mais um pouco. Então debruçou-se sobre o marido e deu-lhe um beijo na fronte, para logo em seguida virar-se do outro lado e ser afagada pelos braços de Morfeu...
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