WALKÜREN - AS TRÊS MARIAS Capítulo Sete
WALKÜREN - AS TRÊS MARIAS
Capítulo Sete
- Professora...
- O que foi, Carlinhos?
- É verdade que tem um dragão lá na lua?
- Um dragão? Na lua?
- É... foi meu tio quem disse...
- Eu acho que não...
- Bom, meu tio é que disse...
- Está errado, professora...
- Está certíssimo, Quinzinho...
- Por que, professora?
- Porque, Carlinhos, não tem dragão nenhum na lua...
- Não?!...
- Não, né, bobão... a lua é feita de queijo...
- Quem te falou isso, Marquinho?
Foi meu avô, professora... e ele disse que quando o queijo está bem grande, vem um rato lá do céu e come ele...
- Nossa... e como seu avô ficou sabendo disso?
- Ah, professora... ele disse que foi o avô do avô do avô dele quem primeiro contou essa história...
Rosa riu... e as crianças a acompanharam no riso... ela estava já a um bom tempo a frente da classe dos pequeninos, e adorava o que fazia. Sempre havia uma história nova das crianças, e assim ela sempre aprendia alguma coisa com elas... dizia sempre para suas colegas que não era ela que ensinava os alunos... eram eles que todo dia a apresentavam a um mundo novo. Sua turma era a do primeiro ano, e seu trabalho era ensinar-lhes as primeiras letras. E, brincando com as crianças, conseguia transmitir-lhes o básico em um tempo realmente curto. Como ela sempre dizia...com amor é mais fácil incutir os ensinamentos aos pequenos. A quanto tempo ela já estava lecionando? Quatro, cinco anos? Ela não tinha certeza... o que podia afirmar é que esse era o período mais feliz que já vivera em sua vida. Quando se lembrava de seu tempo de casada... dizer que sentia calafrios é chover no molhado. Sim, foi uma época triste para ela... e deixou-a de tal forma complexada, que jurou a si mesma que jamais se deixaria dominar por outro homem.
De vez em quando ela se recordava de como se livrou de seu parceiro. Foi como despertar de um pesadelo, com a ajuda de dois anjos endiabrados. Quando se lembrava de como o haviam ridicularizado... não só a ele, mas seus amigos, também... acabava rindo sozinha. Se alguém, antes do ocorrido, lhe dissesse que ela um dia iria levantar a mão contra aquele homem... bem, ela não iria acreditar. Mas não só o enfrentou, como acabou se envolvendo em outras aventuras posteriormente. E ela, que nunca pegara uma arma em sua vida, acabou por trocar tiros com malfeitores... sim, realmente o encontro com aquelas duas moças fora um divisor de águas em sua vida. Maria Izabel ela sempre via quando resolvia caminhar pelo centro. Afinal, "COISAS DE MULHER" a loja dos sonhos de Izabel, ficava na rua principal. E era uma loja bem requisitada. Pessoas das cidades vizinhas se deslocavam até seu povoado para comprar as peças que não eram encontradas em nenhuma outra loja da região. Trabalhavam na loja, além da Izabel e do seu esposo, o Juca, mais duas moças que auxiliavam durante o expediente, dando atenção aos clientes que não cessavam de entrar na loja. Sim, o movimento era intenso... Quanto à Graça... bem dessa quase que não haviam notícias. Desde que se mudara para a Capital, para cuidar de sua mãe doente, perderam o contato. Afinal, o serviço dos correios não era aquele primor... as cartas chegavam... mas era um longo caminho entre o despacho e o recebimento das mesmas... Tudo o que sabiam de Graça é que ela abrira uma loja, onde o principal era sua oficina de costura. Pelo que se dizia, sua clientela era seleta, pois seus serviços eram realmente de qualidade. Que mundo estranho, não é mesmo? Três loucas que viviam trocando socos e tiros com bandoleiros simplesmente abdicaram de suas aventuras para viver uma vida tranquila e calma...
Sim, esse tempo já passara em suas vidas. Agora todas elas eram assentadas, sem aquela loucura de andar a cavalo portando armas na cintura, dormindo ao relento, comendo o que caçavam ou pescavam... sim... agora tinham uma outra vida. Quem via Rosa atualmente nem de longe pensaria que ela já fora uma jaguatirica, pronta para dar o bote no primeiro vacilo de seu oponente. Podemos dizer que as crianças a domaram, com o carinho despretensioso que lhe ofertavam. E, devagar, ao poucos, seu coração foi se amansando e hoje a jaguatirica era uma gatinha tranquila...
O sino tocou, anunciando o encerramento das aulas da manhã... agora Rosa iria almoçar e a tarde... e não é que ela estava com a tarde livre, sem nenhum compromisso? Bem, ela podia aproveitar para passear pelas margens do rio... fazia tempo que ela não ia até lá... tanto tempo que ela nem se lembrava mais... A vez que ela lembrava, e que não foi a ultima, foi na semana em que Graça partiu para a Capital... as três caminhavam pela orla do rio, a princípio em silêncio, apenas admirando a beleza do lugar. depois de caminharem um pouco, sentaram-se em um troco caído, ainda em silêncio, vendo as ondas que se formavam com o vento que soprava sobre o rio... e assim ficaram por um bom tempo. A primeira a reagir da letargia que tomara conta do grupo foi Graça. Sempre a mais atirada, era a líder natural do grupo...
- Meninas...
- Que foi, Graça?
- Vocês entenderam alguma coisa do que aconteceu?
- Não entendi...
- Nem eu, Graça... do que estamos falando?
- Gente... lembram da reunião com os delegados e o pai da Maria?
- Reunião...
- Lembro vagamente...
- Então, gente... até o doutor estava junto com a gente....
- É... acho que estou me lembrando...
- Lembrando do que?
- Não sei... acho que a gente conversou com meu pai e com os outros... depois a gente saiu...
- E a gente foi para onde, depois?
- A gente pegou nossos cavalos...
- E depois?
- Depois? Engraçado... não me lembro...
- Nem eu... estranho, não é?
- Com certeza... afinal, a gente saiu na rua, pegamos nossos cavalos... e aí...
- É... você tem razão...
- É estranho, mesmo...
As
três ficaram em silêncio, novamente, tentando lembrar o que ocorrera
naquela noite... Rosa, ao se lembrar desse dia, continua a não entender
exatamente o que ocorrera naquela época. Tudo o que ela sabia é que
alguma coisa havia acontecido. Mas, exatamente o que... não conseguia
lembrar de nada. Até mesmo seu cargo de professora foi conseguido de uma
maneira estranha. Sem saber exatamente porque, resolveu dar uma
caminhada naquela manhã em que foi admitida. Entrou na escola para
conversar com a diretora, saber se não precisavam de uma substituta, uma
eventual. Embora não estivesse precisando de dinheiro... a parte que
recebera da recompensa realmente valera a pena, queria fazer alguma
coisa para ocupar seus pensamentos... e então... o inspetor de alunos
entrou na diretoria desesperado... havia uma classe de crianças que
simplesmente não tinha professora... a classe constava no registro da
escola, mas não tinha nenhuma docente para cuidar da mesma.
Desnecessário dizer que a diretora nem fez muitas perguntas para Rosa,
logo a enfiou na sala com os pequenos... e Rosa simplesmente adorou. A
química entre ela e as crianças era excelente, e no final da aula a
diretora a contratou para assumir a sala. E aí, mais um mistério... onde
foi parar a professora anterior? O que houve com ela? O mais estranho
nessa história é que ninguém, nem alunos nem funcionários da escola
conseguiam se lembrar dessa pessoa... é como se ela nunca tivesse
existido!
Comentários
Postar um comentário