60 - PASSEANDO NA ORLA DO RIO
60 - PASSEANDO NA ORLA DO RIO
- Nossa, que surpresa boa....
- Estava com saudades de ti, Alberto....
- Que é que eu posso dizer? Uma mulher bonita com saudades de mim...
Alice riu. Um riso gostoso, com a inocência do riso de uma criança. Trazia um cesto em uma das mãos e o depositou em cima da escrivaninha de Alberto.
- E então? Pronto para passearmos um pouco?
-Mas são quatro horas, ainda... a gente não havia combinado de apreciar o por do sol mais tarde?
- Sim... mas o dia está tão gostoso... e acho que não terá problemas se fechar o consultório um pouquinho mais cedo que o normal... afinal de contas, você está à disposição da comunidade o tempo todo, com o consultório aberto ou fechado...
- Bom, isso é verdade... sim, você tem razão... vamos passear...
Alberto tirou seu jaleco e o pendurou no cabide. Enquanto se preparava para saírem, resolveu abrir o cesto, para ver o que a moça havia preparado para os dois... porém, ela não deixou....
- O lanche é uma surpresa... só quando estivermos lá no rio...
- Mas, Alice... deixa de ser malvada... estou com fome agora...
- Não, senhor... você nem ia sair do trabalho agora... portanto não iria comer tão já... dá para esperar um pouco....
- Você é muito malvada, sabia? Castigando assim um pobre faminto...
E os dois riram juntos. Alberto fechou seu consultório, não sem antes afixar um aviso, explicando onde poderiam encontrá-lo em caso de emergência. E lá foram os dois pela alameda, em direção ao rio... conversavam animadamente sobre tudo e sobre nada, que é a forma que todas as pessoas costumam conversar... coisas importantes, mescladas com assuntos que não despertam interesse em ninguém, mas que as pessoas fingem prestar atenção mais por educação do que por qualquer outro motivo. Em determinado momento, Alice resolveu falar sobre o encontro que teve pela manhã...
- Aposto que você não tem ideia de quem encontrei logo cedo...
- Lá vem você com seus joguinhos de adivinhação...
- Deixa de ser chato...
- Está bem... quem você encontrou?
- Tenta adivinhar...
- É alguém importante?
- Não sei... eu pensava que não... agora não tenho certeza...
- Nossa... e quem seria tal pessoa?
- O Seu Zacarias...
- Zacarias? Vocês cruzaram o caminho cedo? Mas ele trabalha na fazenda, e geralmente não vem para o centro pela manhã...
- Eu sei... mas ele havia marcado de se encontrar comigo logo cedo, para conversarmos...
- Sério? E o que ele queria?
- Aí é que fica estranho... não faço a menor ideia...
- Como assim?
- Bom, você sabe que, às vezes, tenho lapsos de memória...
- Sim... e isso me preocupa.
- Pois é... eu me lembro de que a gente se encontrou umas seis horas da manhã, lá na praça. Conversamos por algum tempo. Mas, de repente, quando dei por mim, estava na Dona Mônica, sentada em uma mesa e devorando algumas broas de milho com café com leite...
- E...?
- E é isso... não faço a menor ideia de como fui parar lá na pensão... simplesmente, quando dei por mim, lá estava eu... e não sei sobre o que eu e o Zacarias conversamos.... dá para acreditar?
- Sabe que essa sua condição me preocupa... já te falei mais de mil vezes... você tem que fazer um exame completo, para saber o que está acontecendo contigo...
- Mas ai é que está o problema... eu não sinto que haja algo de errado comigo... só que as vezes eu esqueço de algumas coisas...
- Você não faz mesmo ideia do que seu Zacarias queria contigo?
- Não... é como eu te disse... em um momento a gente estava conversando... e de repente, lá estava eu, na pensão...
É... realmente é estranho... mas é como estou te falando... a gente deveria fazer uns exames para descobrir o que está acontecendo contigo...
Alice dá de ombros, mas sorri com a preocupação de seu amigo. Ela também está preocupada com seus lapsos de memória, mas procura amenizar a situação para que ninguém se inteire da real dimensão de seu problema... que ela não faz a menor ideia de qual seja...
Depois de caminharem por cerca de uma hora pelas margens do rio, encontram um lugar perfeito para fazerem seu piquenique... do outro lado das margens, bem distante, as montanhas serviam de moldura para a natureza. E, quando o sol começou a baixar por trás destas, seus raio iluminando as montanhas, criando uma miríade de cores, tornando o verde em vários tons, os dois jovens ficaram em silêncio, simplesmente abraçados, cabeça com cabeça, apreciando o espetáculo que a natureza proporcionava. Quase que não se ouvia nem mesmo sua respiração, pois os dois estavam absortos em apreciar a beleza que o por do sol mostrava....
- Alice...
- Sim?...
- Já te falei que você está muito linda, hoje?
Alice sorriu. Ela sabia o quanto Alberto a queria. E sentia o mesmo por ele. Mas, por algum motivo, sentia que não deveria alimentar esse sentimento... sentia que não daria certo, que algo desagradável poderia acontecer e que ela se arrependeria por alimentar esse sentimento...
Alberto estava observando a moça, com olhos de cachorro perdido... era apaixonado por ela, sentia que era correspondido. E por isso não conseguia entender a relutância da moça em aceitá-lo. Não havia nenhum motivo plausível para isso. Era uma pessoa de destaque na sociedade, culto, inteligente... e, modéstia às favas, um rapaz deveras bonito... e todo mundo dizia que os dois faziam um lindo par. Por isso, ele não conseguia entender a reserva dela em relação aos dois...
Vendo que não conseguia uma abertura para declarar o que sentia por Alice, Alberto começou a falar sobre o seu dia, os encontros e desencontros em seu consultório. Falou de coisas curiosas que haviam acontecido durante os últimos dias, inclusive o incidente com o Mané da Tiana, pois ainda não havia lhe contado sobre esse ocorrido. Claro que omitiu os detalhes mais escabrosos, mas percebeu uma leve mudança no humor da sua companhia quando tocou nesse assunto, então tratou de mudar rapidamente sobre o que conversavam. A noite estava fresca e agradável, mas, de repente, Alberto começou a se sentir desconfortável. E sugeriu à moça que retornassem ao vilarejo, no que foi aceito de pronto.
Comentários
Postar um comentário