Lembranças

 

São oito horas da manhã de domingo, os sinos da igreja chamam os fiéis para o culto dominical. Ao mesmo tempo, me remetem ao passado, lá pelos anos 62, 63... não posso precisar o ano exato... mas eu tinha menos de seis anos, isso tenho certeza, pois não estava ainda no pré-primário. Bem, Meu pai era louco por música sertaneja. Adorava cururu, catira, cateretê, moda de viola, toada... Arranhava uma viola (tira a vírgula) de vez em quando (Tinha ciúmes do instrumento, nem minha mãe podia encostar a mão no mesmo...). Naquela época ele costumava cantar com os vizinhos, amigos de copo de longa data (todos vieram da mesma região do Vale do Paraíba, aos pés da Serra da Mantiqueira...). Começavam a cantoria sóbrios, mas lá pela quarta garrafa de cachaça já não conseguiam achar nem as cordas dos instrumentos para tocar, quanto mais cantar... o repertório eram as modinhas que ouviam no rádio. Liu e Léo,( a dupla favorita de meu pai), Zico e Zeca, Lourenço e Lourival, Tonico e Tinoco, Tuta e Tota... esses últimos, inclusive, tinham um programa na Radio Bandeirantes todo domingo pela manhã (Patrocínio do Biotônico Fontoura, o maior Fortificante) que era seguido por um outro chamado de "Roda de Violeiros". Todos os dois ao vivo e abertos ao público. Quem quisesse prestigiar os artistas, tinha entrada franca. Meu pai ia de vez em quando .Saia no domingo de manhãzinha, todo arrumado, Glostora no cabelo e camisa cáqui de motorista de ônibus (não era, mas gostava de se vestir assim). Nunca levou minha mãe. Não se davam muito bem, acho.. Talvez porque, geralmente quando voltava de seus passeios, estava em estado de embriaguez e ficava extremamente violento. Ou talvez porque, no lugar de minha mãe, preferisse sair com suas conquistas (era um rapaz bonito... sem vergonha como um cachorro vira-latas, mas muito bonito). O certo é que sempre tinha uma nova amante e em algumas ocasiões desfilava abraçado com a outra na frente de minha mãe, sem se importar em ferir seus sentimentos. É, minha mãe enfrentou uma barra muito pesada. E, se fosse só isso, não seria tão ruim, assim. O problema é que ele ficava violento quando bebia, como já disse... e, não raras vezes, agredia minha mãe. Ela tentou deixá-lo algumas vezes, mas sempre voltava. Viviam em paz por algum tempo, então tudo voltava ao que era antes. Mas ela persistia, pois como dizia para mim e meu irmão, "o casamento é para sempre... separação é pecado mortal..."! Viveram juntos, aos trancos e barrancos, até meu pai falecer, aos setenta anos de idade. Mas não era sobre isso que eu ia falar. É que, de repente, me desviei do assunto principal, que era a "Roda de Violeiros". Até a década de setenta a gente costumava ir aos circos para ver os shows dos artistas. Não era como hoje, quando eles se apresentam em casas de espetáculos e teatros. Não, naquela época ele se apresentavam na periferia. E era tão gostoso....o circo chegava em um bairro, armava sua lona e ali ficava por duas, três semanas. E nesse tempo desfilava um sem-número de artistas, muitos já consagrados pelo grande público. Foi assim que tive o prazer de ouvir, ao vivo, Tonico e Tinoco, entre outros. Eu era pequena, tinha uns seis anos quando os vi pela primeira vez. O show era dividido em duas partes, primeiro eles cantavam, apresentando suas canções e na segunda parte apresentavam uma peça teatral. A peça apresentada se chamava "Invés de me agradecer", se não me engano. Era um drama, escrito pelo Tonico. Antes da sessão, na porta do circo, vendiam pipoca, maçã caramelizada, aquele espetinho que era uma delícia.... tá certo, quando a gente tem seis anos, tudo é uma delícia. Bem, quando a gente ia ao circo (meu pai levava toda a família para a sessão) era um passeio muito gostoso. Aliás, devo confessar que era uma das poucas vezes que a gente saia em família... o pai, a mãe e as duas crianças. E era tão bom....

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